
ALCÂNTARA, hugo.
20/06/2023
PARA P. M.
Eu podia começar com todos os questionamentos que murmuram na minha cabeça, mas do que é humano não se entende e isso eu vou findar sem entender, talvez nem aceitar eu vá, no final, do que é humano, do que é complexo e eu não te perdoo.
Por todas as variantes do momento, tudo que tangenciava minha vulnerabilidade, eu não consigo te perdoar, apesar de querer, mas não leve pro pessoal, tenho questões com o ato de perdoar, quem quer que seja, inclusive a mim.
Para quem não é P.: se eu te contasse que me acusaram de estupro, o que você diria? Você pensaria, ou até chegaria a me dizer, que pelo menos eu que não tinha sido estuprado, sequer estuprado alguém nessa acusação inconsistente? Que, de todas, minha posição é e era a melhor?
Eu vi o diabo naquele dia e eu estava embriagado. O diabo bebeu comigo e me entornou, cara a cara, de dentro de minha própria barriga e me arrebatou centrífugo. Meu diabo adormecido, mais vivo que nunca, latente no meu sangue, viu naquele gatilho uma chance de me arrastar de vez pro submundo da loucura e ele quase conseguiu, cheguei a pensar que ele ia, de fato, me arrastar pro inferno dessa vez.
E você deve se perguntar a explicação de eu soar tão mórbido, tão negativo e pessimista, eu te lanço: melhor te mostrar quem sou eu do que desenhar flores que cheirarão à carnificina que às vezes me povoa, melhor eu te permitir me amar assim, como ser humano, do que te iludir numa fantasia febril de bem-estar.
Eu estava passando por um inferno sem esse diabo acordado quando eu fiquei sabendo, me imergiu em cólera - E me desculpe se minha palavra te fere, leitor, P. ou não, o verbo é lança, que não volta, que corta a carne e a si mesmo.
Como eu poderia fazer com você o que fodeu minha história? Como eu poderia fazer com você, P., meu amigo conhecido, amante, que eu não era perdidamente apaixonado, mas que que eu tinha um grande carinho, o que me criou um diabo? Como teria coragem eu, sanguíneo melancólico, de fazer com você o que fizeram comigo e que fez de mim um inferno ambulante entre os vivos? Eu ruiria e me consumiria, volátil, em chamas azuis e brancas, brandas.
Dos confins da minha barriga ele grita:
- Amem-se, humanos, pois é tudo que vos resta, é tudo o que vos faz humanos e vivos, ou sucumbam dentro das suas próprias barrigas, pelas suas próprias línguas, pelo seu próprio verbo, pois de mim brotam diabos que contagiam vocês como um vírus e sempre será.
Conseguiu o que queria? Se sim, valeu à pena? Eu sou tão descartável assim? Ou a intenção era não ser pessoal? Me bateu como uma bomba de qualquer forma...
E eu, carbonizado, colapsado pelo diabo que acordara, senti o enxofre subir-me à garganta como fogo sobe à boca de um dragão, e rugi, como um monstro, pois é assim que eu tendo a me sentir.
Eu só tinha 8 anos, quando conheci o mundo e o diabo que me habita. E você, P. M., meu caro, tornou-o alado dentro de mim.
Eu te odeio por isso e eu não vou te perdoar, assim como eu nunca me perdoarei. Essa dívida eu levo pro meu túmulo. E é assim que eu me sinto.
28/09/2022
ENSAIO SOBRE A MINHA ARTE (LIBERDADE)
Sempre será enigmático a forma que começo uma composição, às vezes de um jeito, de outro, assim. Mas que discorra sempre ao meu ver, do meu jeito, que transborde sempre do meu mundo de ideias como um filete de água, prata e brilhante água, que se agrupa e escorre da barragem caótica do meu intelecto, minha psique corrente. Que seja um juramento, minha arte, minhas regras, minha luz.
É com esse juramento que eu eternizo, é com ele que eu me faço presente, manifesto minha arte. Eu sei que estou ficando velho, como todo ser humano que se preze, parece que eu vou carregar a incerteza do artista para o meu túmulo, ser-me-ia eu como acho que seria? Ou igualmente cativa seria minha alma?
Não sei se divago sobre minha arte, liberdade, ou até que ponto as duas seriam uma só. Mas minha arte é meu presente, não em tempo, mas em dádiva, é o que me faz cogitar o divino junto com a paixão, coincidências e a natureza. Sinto-me agraciado, não sei por quem, ou o que, mas me sinto.
Minha liberdade é uma faca de dois gumes que me sangra em toda tentativa, em toda exposição, em toda ação, toda palavra. Reflito sobre o propósito de todo o sentimento, de todo o estardalhar de sensações ou dos pensamentos que reverberam, reflito se existe um propósito, talvez o de ser artista.
Artista cativo, da nova era, da mais nova geração, mas também não tanto, afinal eu sei que estou ficando velho, como todo ser humano que se preze e isso me assusta. No final é sempre como um desabafo, um monólogo sincero, equivalente ao que diriam da alma, de coração, pois minha arte, além de liberdade, remedia, alivia e existe, seja ela como for, ela resiste.
22/07/2018
Lion
Eu sei que tudo que sei e digo é relato, as vezes imaginário e pessoal, porém relato. Peças de lembranças que edificam uma consciência inteira! Sublimes fascínios e prazeres e então essa consciência.
Inconsciente eis que:
Ele sabia que existiam palavras para descrever tal sensação, mas que fugiam do seu vocabulário não por ignorância, mas por nervosismo!
Ele tem em mente que tudo isso faz parte de um teatro, um experimento, mas como ator sentia o impacto da interpretação.
Um rosto de ferro e drogas.
Eu queria jogá-lo de um precipício, mas tê-lo já era uma queda, larga e profunda queda, inacabável sensação de desespero, quando o chão não é preocupante e sim o inacabável penhasco e a ansiedade do desabamento emocional e físico.
entender que existem mil formas de sentir e dez mil de compreender é fundamental para quem continua pulsando. um selar de cílios e está feito! você foi pego. perceber que de nada adiantou desafiar e gritar “catch me if you can”, depois de ser capturado, é frustrante e depreciativo.
sentir até a lua e de volta demora e todas as escolhas tendem o imediatismo do agora, tudo se inclina para ser sempre um jardim de palavras, um mar de rosas, de espinhos, sempre pairando o exagero mórbido e a frágil delicadeza de ser e carregar o que é.
não me lembro, mas dói quando eu respiro.
Toda a nostalgia dos didáticos infantis e as trepadeiras que tornam as pequenas cidades ensolaradas recanto pacífico dos espíritos que se alimentam de passado. Eu me alimento de passado.
E a questão toda foi essa!
Eu ponderava, eu justificava e media reações, pois não faltavam vivências e conselhos para me lembrar que jogos malvados correm as estradas negras e nós corremos sobre elas num intenso suspiro e na frenética esperança que tudo fique bem não só quando é pra ser bem.
Eu sou viciado em começos e faltam razões para priorizar meus relacionamentos pois eu carrego a suficiência de ser quem sou, apesar de meus medos e receios, mas sigo nitroglicerinado e embebido em éter, que incendeia e apazigua, que encanta e esfaqueia, que sobe e desce, que arranca de zero à luz em segundos e bate de frente no muro branco de aflição e desinteresse. que ama eternamente até que o eterno expire e escorra pelos poros, olhos e dedos.
Eu não estou disposto a esquecer o que me elevou, o que me fez sentir o que nunca havia sentido, cultivar, fazer questão, adjetivar, falar para os amigos e família, me orgulhar, ter afeto, não entender e aceitar por sentir a grandiosidade do bem que fazia. Não estou preparado também, já que me forçou, nem acredito ser capaz.
Eu pesei, mas me priorizo, eu pesei nele e em cima dele, eu me justifico por ter sido sincero, foi perverso e verdadeiro também.
Eu mesmo nunca pensei que precisaria de você e nunca pensei que te perderia, eu nunca pensei que me apaixonaria por você e nunca cogitei te ver ir pra, talvez, nunca mais.
Eu realmente pensei que nunca iríamos nos perder e dei motivos pra isso e sei que hoje ele não tem certeza o suficiente que eu realmente um dia realizei que seríamos como um livro no eterno balbuciar das palavras, preciso lembrá-lo de que um dia eu senti eterno, se um dia realmente fui.
Tudo que resta pra ele é incerteza. Se um dia foi recíproco se foi verdadeiro se existiu amor se existiu devoção se foi de fato eterno enquanto durou se aquilo tudo foi sentido mesmo se alguma infame palavra que saiu daquela boca perdida teve fundo de verdade se alguma lágrima que escorreu daquele olho de ferro foi quente ou fria como o término.
Eu não sei.
Eu preciso saber.
14/02/2018
Clair de Lune
Luar, o moreno e sua suavidade tão intensa.
Clarão em meio aos corvos, drama e muita conversa pesam nas minhas cachoeiras, mundos inteiros que giram em minhas órbitas, meus olhos giram, meu mundo gira, meus mundos colidem.
Culpado.
Segunda parte.
Pesaram, giraram, giraram, giraram, colidiram.
Resta a suavidade da tristeza crônica, resta tristeza em meio a qualquer outro sentimento, linha tênue e contínua, inabalável constância do segmento, paira sobre mim ininterrupta.
“Nunca” é uma promessa e você não tinha meios para mentir.
Eu nunca precisei de uma mentira.
Deixa assim, sereno enquanto ainda anoitece.
Minha rotina se dava em viver em exclusividade para ser o luar que iluminava sua vida.
Terceira parte.
Carrossel no céu, selva branca.
Brusco como a branquidão do Luar cheio, cheio de olhos e de amargura, grandes olhos que me observavam.
Grandes olhos que me sustentavam, grandes olhos que me alimentaram a alma por incansáveis dias. Grandes olhos que eu tanto fui devoto.
Olhos brancos, dentes brancos, Clair de Lune.
Quarta parte.
Seu mundo era saudade.
Eu carreguei seu mundo nas costas e isso pra mim era um privilégio.
Você era privilégio.
Eu era ecstasy, doce surreal.
Quinta parte.
Tudo que não se vê é de deus, você é deus.
Quem bem vê, bem sente.
A quem se deve a culpa da colisão das estrelas?
Seu próprio Sol e estrelas!
Eu te amava dos pés a cabeça e sigo a continuidade dos amores que ardem, que insistem em bater.
Corações insistem em bater.
Sexta parte.
É fim de mais uma madrugada.
O mundo espera os filetes de Sol que descem pelas colinas.
Perdi as estrelas cor de prata, mas o Sol é amarelo ouro!
Banhos de Lua sempre me acalmaram e isso tudo deve ser sinônimo de calmaria.
Sétima parte.
Mais uma vez me despeço do clarão de Lua, mas dessa vez eu me despedi da Lua que ainda estava em mim, sobre minha cabeça, dentro dos meus olhos, viva no meu peito.
Ainda a vejo subir a colina, ainda vejo os filetes de prata se entrelaçarem com os de Sol, mas ninguém explica o que são as despedidas e eu entendo como sendo assim.
Mornas despedidas, mornas lembranças, mornos sentimentos, dunas de areia branca.
Dunas que se sobrepõem em camadas etéreas de areia fina.
Fui intenso enquanto pude.
Enquanto durou foi eterno.
E eu eternamente fui por você, pra você e com você.
27/11/2016
CORRA, LOLITA, CORRA!
Eu transei com os corpos mais quentes de minha geração, dormentes, em choque, flagelados e duros corpos que me levaram ao êxtase de uma existência. E o tenho feito.
Clamo por aqueles que imploraram por mais sangue, pelos que rezaram ao surgir da décima oitava Lua, que entorpeceram seus pensamentos nas festas dançantes isoladas e que nelas rebolaram seus quadris em sintonia com as rondas e os beats.
Todo o complexo sistema flui pela essência poética das partes.
Rodas quentes de borracha cheiram a deserto, desertos cortados por perpétuas estradas vestidas de asfalto, pedras e cânions e águias esvoaçantes e cachos castanhos nos pêndulos incoerentes das pousadas neons, solitárias e bem abertas pousadas neons.
Bêbados e invertidos, angustiados nervos perplexos por incompreensão de sua própria autodestruição, garrafas vazias, carne passada e cigarros viciosos caindo dos dedos esguios.
Brancas feições clichês, solidão mortuária, banhados, ferozes leões de jaqueta de couro, pelas constelações mutantes espalhadas na vastidão escura da alma.
Perdidos em seus próprios copos vazios, faltam cigarros para descrever os dedos, bocas salgadas, botas e fogueiras cansadas.
Descendem das capitais e de seus cubículos gelados, onde habitam escritores fracassados e mentes atônitas, sedentas famílias alienadas com jovens revoltosos, jovens que fumam maconha para dormir e tomam doce para despertar, ciclos contínuos e iluminados, revoltos de névoa, mentes frescas e corpos sujos de erotismo vulgar e drogado. Jovens subversivos tentando mostrar para o mundo o mundo, de fato entendem limites, de fato têm razão, são eles os certos, são eles os sensatos, são eles os pródigos e sábios, jovens incompreendidos que são. São os que desabrocham no floor, com sua moda adiante, com seus jeans colados e insinuosos, com seus paus saltando para fora do umbigo e bocetas meladas que exalam prazer febril e bundas cheirosas e ansiosas e safadas.
As pedras tendem orgias inacabáveis, as flores anseiam por coroas prazerosas e ensanguentadas. Foi-se santo até o último badalar do sino, até a última luz acesa. E tomado pela escuridão caridosa, que exporta a imagem do bom e do romântico, ergueu os falsos pilares de sua glória, energizando os suicidas, os pulsos, o vazio sentimental dos manicômios, os jardins mórbidos dos cemitérios e a completa inexistência de si, em si e para si.
Deu-se folga pra mais de uma década, afogou-se em alguns segundos. Foi bem, hoje é bem menos
23/08/2016
Ode de Aquiles
Todos temos axiomas pessoais.
O meu é por demais profundo, afundo no intro e sólido no aspecto.
Não o entendo, ou vejo, ou localizo, ou permeio, ou intensifico, ou amenizo, nem sequer sonho.
Só sinto. Ode de Aquiles!
Um sentimento hipocondríaco, meu e de mim mesmo.
Doses violentas já não são meu forte.
Rosas oxidadas no jardim das mucosas.
Serenamente em sintonia com o corpo, mente transborda uma lucidez forçada que não me atina!
Rosas oxidadas no jardim das mucosas.
Não padronizar os olhos apenas por não ser padrão.
Olhos azuis, jeans azul, isqueiro azul e áurea também.
Mútuo sentimento de invalidez, meu e de mim mesmo.
Polilateral em discórida.
Eclosão dos flúidos, recatados prazeres mórbidos, falsa sensação melancólica de passado e inexistência de vivência em meus futuros mais próximos.
Rosas oxidadas no jardim das mucosas.
Eu bem me queria no cair das pétalas, doce ninar febril.
Mal me queria no fechar dos cílios, disposição ao caos.
Bem me queria também em agudos, estridentes e prazerosos ruídos ressoantes.
Mal me queria no abandono inesperado das espectativas.
Rosas oxidadas no jardim das mucosas.
Aurora dos meus sonhos, Narciso, que estende teu olhar contra ti mesmo, desvia-te do reflexo flamejante de tuas palavras e volta-se contra mim, ó flor estirpada, com tua fúria que reverbera!
Reverbere!
Faça ecoar pelos 17 cantos do teu ponto G.
Mova todas as cascatas da tua sombria glória, pedra por pedra deixe-se escorrer que minha boca estará posta a te beber em sumo e em cores.
Rosas oxidadas no jardim das mucosas.
Monstro multifaces que me aterroriza, fossa dos meus desânimos, me condena a vida eterna a teu lado, que de manhã em manhã povoarei coroas floridas em tuas cabeças.
Rosas oxidadas nos jardim das mucosas.
27/04/2016
Ascendente em flores
Sou de flores, ascendente em Hortências. Sou um espírito banhado de rosas e venho contar uma história aveludada, outrora espinhosa... Um tempo, em meio a calmaria do meu jardim zumbido, pertubou abrupto uma ventania prateada, de pó e secura, de bronze e peso, que borrou minhas flores e secou meus brotos, descobriu meus braços e se apossou de minha pele, se instalou em calúnias e apossou minhas almas com sua própria confusão e fúria, deixando meus miolos expostos e meu pólem infértil, deixando meus pensamentos revirados e atordoados, arrebatou minha terra fofa e descascou meu tronco, minhas costas foram aradas e desnudas ficaram latejando em vermelho vivo, vermelho rosa. Diálogo não existiu nessa posse injusta, nesse beijo roubado, nessa insuniação pretenciosa. Imperou sobre minhas raízes, ordenou desfeita, manipulou desordem e tratou de ser breve em fazê-lo. Depois do redemoinho, depois da rebordosa, depois de espalhar minhas folhas pediu que fosse calmo, sereno, breve e afável, me fez em chamas, me tomou nos braços, me fez morada ordenando sensibilidade, me convenceu com reciprocidade, me enganou com os mesmos buquês baratos, os mesmos perfumes roubados de outros jardins, os mesmos presentes de pedras, as mesmas gemas, os mesmos quartzos azuis. Pediu que florescesse mas cortou com brasa cada pétala vermelha dos meus olhos, pediu que desabrochasse mas cerrou os pulsos e meus caules, por fim pediu que colorisse o seu jardim, mas só me deu tons de preto e cinza... Me afogou em salmora e extraiu minha preciosidades - pedras, perfumes e flores - para encantar outros jardins, me deixou somente com terra árida, com cascalho grosso, com mágoa e vazio de secar qualquer vida que se atreva a brotar em mim. Deixou pra trás um cemitério de flora, não florido, túmulos que não transbordam petúnias, mas que estão recheados delas, altares de gesso, feridas expostas.Me ceifou sem pudor nem cuidado...
-Hugo Alcântara
30/03/2016
O bruxo
As margens do meu ego estão corrompidas pela droga líquida que escorre pelas minhas pernas. É profundo o desejo do pesar, o querer arrebata de maneira brusca cada divino pedaço do meu corpo. O carnal é maravilhosamente atrativo, o astral é perfeitamente invasivo.
Cada promessa de encontro, toda e qualquer jura de amor perdido e bandido, tudo de bom que sai dos lábios vermelhos e perfumados por saliva fresca acumulam nos meus ouvidos rosas recém cortadas para a comunhão do inexato e incostante. Exausto de emoções não era acostumado a permanência, ao querer repentino e recorrente. Tudo gira e me lança, violentamente, contra a parede branca da minha própria consciência.
Certa vez meu introaspecto, em sonho confuso e psicodélico, me relatou que "o verme pútrido da terra há de roer tuas veias e no teu coração arruinado fazer morada, mas a pior dor onde teu eu habitará será a certeza de que tuas memórias, que tanto vos pesa, serão eternizadas no mármore vermelho do teu consciente, amém". Atordoado e desgostoso dessa afirmação, tratei de penar, ainda em sonho, sob os pés da morte, que de consolo me arrancou as íris prometendo-me que os ecos do meu sofrimento iriam perfurar meus ouvidos, mas não mais veria, afinal o que os olhos não veem o coração não sente. Engano meu, golpe de morte. Minha mente no pós morte estava ativa e sempre fui muito inventivo, como o sonho é reflexo de minha personalidade, voltei incessantes vezes a ouvir e lembrar dos pesares, podres lembranças fúteis, que continuaram a me atordoar pela eternindade até que a vida novamente me buscasse para renovar meu contrato.
Acordei.
Tudo esse reboliço mental por amores. Todo esse desconforto psíquico por juras incosistentes, sem retorno, sem atenção, sem o carinho esperado, nutrindo de maneira covarde as expectativas que, como corvos, rondavam os buracos nas feridas abertas das minhas íris. O cheiro novo de pele ainda é atrativo e mesmo a anos sinto vívido em minhas narinas, sinto quente o peso em minhas costas, sinto molhado os lábios em meu pescoço. De emocional, conte-me uma história que preencha minha mente, imploro oferecendo meus olhos incompletos, meus lábios inchados, até minhas lágrimas, mas em volta me conte uma história, só uma aventura contada para me fazer esqueçer do limbo que estou, que, por intuição, sei que estou enterrado a tempos.
24/11/2015
Meus lábios teus
É inútil observar a decadência, de mãos atadas, constatar que o fim se aproxima e que o infinito se expande.
É inútil estar convicto do fracasso, consciente do ininterrupto, e satisfeito com a plena – desse o único que se faz sólido – tristeza.
Todos os sentimentos estão aglomerados, todos os maus presságios bailam de encontro, tudo de belo está desencontrado e a nuvem que cobre meus olhos não se dissipa. Oscilam ao caos todas as esferas, todo o equilíbrio, todo o amor.
É absoluto! É universal.
É em memória de todos os prazeres perdidos.
Fracasso e decadência. Habitam e persistem. Meu paradigma. A vinda de um, ou sequer sua anunciação, é a certeza de que o outro está por vir.
Não é de se lamentar, é para refletir. E como reflito…
Mas não sentirei por mais.
Não antes de beijar-lhe os lábios. Não antes de ter-lhe por completo.
Nem que pra isso um de nós morra, mesmo que metaforicamente eu – imaculado em seu corpo.
Não antes que meu eu termine,
Ou que o infinito não mais se expanda,
Não antes da verdadeira morte,
Ou que o último beijo tenha gosto de sangue.
Se partir, vá depressa, só não olhe para trás para tirar-me mais um suspiro. Voe logo, sem delongas, tenha pelo menos piedade.
Se ficar, fique com força, fique firme, fique a dois e a sós, fique intacto e sutil. Sinta-se à vontade para embriagar-se.
Se partir, não sentirei, não mais, mas morto.
Fique e abuse.
Por fim não é um apelo, nem um aviso. É uma certeza, uma verdade.
Parte de mim.
15/09/2015
Epopéia
A rotia nunca se mostrou tão impertinente e monótona.
O abismo que fere minhas entranhas se alarga numa constante reação interplanetária: minhas órbitas estão em Plutão.
As milhares de áureas nervosas que cruzam meus espaços dilaceram meu centro num completo estardalhar de conclusões.
Seria injusto com o mundo, ao mesmo tempo egocêntrico, achar que o tudo em sua essência é apenas minha consciência?
Pois vamos: a realidade é que apenas baila no fundo negro da inexistência meu ego e tudo que se forma é apenas uma projeção imaginária. O infinito espacial, a ordem do tempo, o constante da matéria e a condição de vivo são apenas minha consciência num longo e profundo sonho.
É o começo de minha epopéia!
A vida sou eu e, por desconhecido, sou uma projeção ignorante de mim mesmo.
Amorosamente eu sou o caveleiro de armadura de ouro e seios fartos, minha donzela é a aspirante enigmática do zen budismo.
O destino convexo e abrangente é a certeza da inexistência e impotência humana.
É o decorrer de minha epopéia!
Quebrei a barreira do inimaginável, é quase um desvendar, mas pela falha emocional, afundei um pouco mais na sombra de dúvida. Continua assustador o fato de que o mundo é minha plena consciência e que eu, ignorante, sou fruto dela. Quem sou eu? É o clichê que me define.
Sou o bufante homérico que futura a velhice plena e regada por glória. Sou o convecimento exarcebado de Júpiter. Sou o ápice da fraqueza no limbo dos aflitos.
É o desfecho da minha epopéia!
Sou o confim dos infernos que ardem pelo julgamento previsível nas mãos de Chronos. O fim é o começo de uma nova cena e, novamente, o infinito se resume a infame sensação de projeção.
Assim se confirma a análise da existência. O nada é o tudo que escorre pela inexistência do presente.
Assim se dá o conforto das almas perdidas. Todas foram fracassos ou lapsos do meu indomável sonho.
Assim se conclui a origem da vida.
Tudo e Nada.
Tudo em Nada.
Tudo é Nada.
-Victor Hugo Alcântara
16/06/2015
Vomitar-me-ei
Muito tempo sem relatar futilezas nesse meu espaço não significa falta de inspiração, falta de tempo ou falta de vontade. Enfim. Venho apertando minha mente a tempos e hoje vomitei tudo. Vomitei mesmo, literalmente e emocionalmente. Botei pra fora comida velha, emoções velhas, sujeira, limpeza de mais, devaneios tolos. Hoje me dei conta do quanto é bom tomar banho no escuro, o quão relaxante é tomar banho no escuro. Sem medo, sem vergonha, sozinho. Você e seu ego, sua calma, sua fúria e seu vômito. Tinha cheiro de álcool mas era pscicológico, a solidão estava condensada em meus olhos, era tão transparente e acolhedor...
Tomar banho no breu é realmente muito bom, soa estranho, não soa comum.
Fui vomitando emocionalmente tudo, fui me limpando. Fui purificando minha consciência...
-Você foi, ralo abaixo, junto com meu vômito.
Ah, mas amorosamente: a maciez da pele dele ainda está na ponta dos meus dedos... RALO ABAIXO.
Foi tão nojento, não o vômito, mas aquele monte de podridão misturada... Vou parar de pensar nisso, senão vou ter que botar tudo pra fora novamente.
Banho no escuro ainda continua bom, banho no breu ainda continua ótimo.
Mas agora eu apredi: todo dia, além do escuro, vou vomitar, vou me lavar por dentro, afinal: não se deve comer bicho morto, não se deve comer carniça, muito menos guardar dentro da carne, muito menos acumular lixo.
Vamos, meu amor, meu doce amor, meu doce e sujo desejo, vomite essa porra toda.
28/02/2015
CARNE NUA
Sempre fui devoto aos prazeres carnais, não nego, afinal de contas, sempre me ajoelhei diante da carne.
Um clichê de contos eróticos define e começa minha vivência: "era um crepúsculo radiante de euforia e tocar a pele do outro era doce e macio."
Definido.
Pois bem, tocar a pele do outro era realmente doce e macio, sentir aquele cheiro era tão maravilhosamente íntimo, era um cheiro suave, confortante.
Contato.
Músculo.
Desejo.
A trindade de minha emoção. Sim, sentimentalizado!
Como era evidente o prazer carnal! Boca seca, um tanto aberta; corpo contraído, por inteiro; respiração ofegante, carregada.
Nos milhões de cachos me perdi.
Na brancura de sua pele me deleitei.
Na definição de seus lábios me achei.
Em seu olhar me vi refletido em mármore verde, constante.
Foi universal em mim. Foi agudo e estridente. Foi o ápice de meu corpo entregue.
Tinha a força de vulcões ativos, derramando sua escória sobre a carne nua. Era honra os corpos alucinados pelo caos de sua entrega. Eram dois Sóis que ardiam nas nuances da chama ativa. Era imenso, grandioso.
Era meu, por inteiro.
-Victor Hugo Alcântara
23/02/2015
SOLIDÃO
Era de julgamento vulgo qualquer crítica lançada àquela pobre alma cabisbaixa por ente os jovens tumultosos. Ela era diferente. Ela era mais introspectiva, sentimentalista... Sua alma era carregada de pesares, seus, do seu mundo, do mundo que ela habitava. Seus vícios eram tão profundos que em sua pele estavam marcados como cicatrizes. Ela era viciada em solidão. A plenitude do abandono a saciava. O conforto de mais ninguém habitava aquele corpo ressequido. A sensação de auto-suficiência era devastadoramente atrativa. Apenas a sensação! Seu fato era destinto: calor humano era fundamental em sua existência... Dentre fatos arbitrários, sua imensidão de carência só mais a atingia. Replicada. Conduzida. Induzida. Sonora. Sua vida era a mesma mas renascia todos os dias numa completa metamorfose de paradoxos.
-Victor Hugo Alcântara
22/02/2015
CORREDEIRAS DA DISCÓRDIA
Choveu em mim e quando me dei conta havia chovido lá fora também. Os pingos nos meus olhos eram como os pingos da janela. Já tinha o costume de evitar a cólera dos meus sonhos, de isolar o pesar de almas passadas e de ignorar o sofrimento alheio pois as minhas reservas internas conseguiam, por si só, suprir minhas necessidades fisiológicas de carência.
Sabe a sensação de exalar desespero?
É horrível!
O inspirar forçado, o expirar carregado.
O dormir calado, o acordar exausto.
Tudo conspira ao caos, tudo transparece medo, tudo revela tensão e o trilho por onde a vida passa faz ponte nas corredeiras da discórdia.
Imagine um barquinho.
-Eu estou nesse barquinho.
Nele é tudo pleno e confortável. De lá eu tenho a vista clara da vida se arrastando pela ponte que passa sobre mim.
É rotina, não costume.
É fato, não hipótese.
Pulsar se torna cansativo a cada dia e todo esse redemoinho mói minha cabeça e a despedaça um milhão de pedacinhos.
Carregar o fardo é necessário, ter que aguentá-lo já não é mais sadio.
Intensifique!
Sentimentalize!
É normal... A vida te acostuma.
-Victor Hugo Alcântara
21/02/2015
DEPRESSÃO
Hoje me deparei meio corrido, observando jovens e invejando seus aspectos.
Percebi que meu intro, aspecto, não seria marcado por sangue mais uma vez. Guardei a navalha. Meu amigo. Minha amiga. A navalha está mais em alta do que eu. Hoje todos têm a navalha. Hoje é bonito e legal usá-la.
Mas a guardei. Hoje eu senti medo de usá-la e me ceifar de vida.
Hoje eu só observei mais de perto a beleza dos jonvens. Minhas pernas trazem um pouco mais de cicatrizes que eles, eu acho, afinal isso está tão em alta, enfim, observei mais atentamente, me lustrei com mais um pouco de glória, a inveja quase me queimava os olhos, mas a dor de observá-los junto com a inveja interior era, pra minha psicopatia, sadia.
Eu não tinha.
Eu não tinha.
Eu não tinha.
Navalha. Fio. Não resisti.
Mais uma vez, infelizmente, havia manchado meu dia de vermelho.
-Victor Hugo Alcântara
Clair de Lune
Luar, o moreno e sua suavidade tão intensa.
Clarão em meio aos corvos, drama e muita conversa pesam nas minhas cachoeiras, mundo inteiros que giram em minhas órbitas, meu olhos giram, meu mundo gira, meus mundos colidem. Culpado.
Segunda parte.
Pesaram, giraram, giraram, giraram, colidiram.
Resta a suavidade da tristeza crônica, resta tristeza em meio a qualquer outro sentimento, linha tênue e contínua, inabalável constância do segmento, paira sobre mim ininterrupta.
“Nunca” é uma promessa e você não tinha meios para mentir.
Eu nunca precisei de uma mentira.
Deixa assim, sereno enquanto ainda anoitece.
Minha rotina se dava em viver em exclusividade para ser o luar que iluminava sua vida.
Terceira parte.
Carrossel no céu, selva branca.
Brusco como a branquidão do Luar cheio, cheio de olhos e de amargura, grandes olhos que me observavam.
Grandes olhos que me sustentavam, grandes olhos que me alimentaram a alma por incansáveis dias. Grandes olhos que eu tanto fui devoto.
Olhos brancos, dentes brancos, Clair de Lune.
Quarta parte.
Seu mundo era saudade.
Eu carreguei seu mundo nas costas e isso pra mim era um privilégio.
Você era privilégio.
Eu era ecstasy, doce surreal.
Quinta parte.
Tudo que não se vê é de deus, você é deus.
Quem bem vê, bem sente.
A quem se deve a culpa da colisão das estrelas?
Seu próprio Sol e estrelas!
Eu te amava dos pés a cabeça e sigo a continuidade dos amores que ardem, que insistem em bater.
Corações insistem em bater.
Sexta parte.
É fim de mais uma madrugada.
O mundo espera os filetes de Sol que descem pelas colinas.
Perdi as estrelas cor de prata, mas o Sol é amarelo ouro!
Banhos de Lua sempre me acalmaram e isso tudo deve ser sinônimo de calmaria.
Deve ser...
Sétima parte.
Mais uma vez me despeço do clarão de Lua, mas dessa vez eu me despedi da Lua que ainda estava em mim, sobre minha cabeça, dentro dos meus olhos, viva no meu peito.
Ainda a vejo subir a colina, ainda vejo os filetes de prata se entrelaçarem com os de Sol, mas ninguém explica o que são as despedidas e eu entendo como sendo assim.
Mornas despedidas, mornas lembranças, mornos sentimentos, dunas de areia branca.
Dunas que se sobrepõem em camadas etéreas de areia fina.
Fui intenso enquanto pude.
Enquanto durou foi eterno.
E eu eternamente fui por você, pra você e com você.